5 razões da falta de sucesso na implantação da gestão em fazendas de leite
Prof. Dr. Paulo Machado
Coordenador da Clínica do Leite – ESALQ/USP
Começamos a disponibilizar o Sistema MDA (Gestão de Empresas Produtoras de Leite) para os produtores de leite por volta de 2001. O Sistema MDA tem como propósito mudar a forma de pensar e de enfrentar as coisas da vida pessoal e profissional de maneira a sermos mais felizes e termos sucesso na pecuária de leite.
Uma das perguntas que os alunos sempre fazem é “se alguém já implantou as ferramentas e seus conceitos na totalidade”. Minha resposta é que todos já implantaram uma parte ou outra. Alguns quase que 100%, outros muito menos. De qualquer maneira fico sempre me questionando se não deveríamos ter sempre 100% de implantação visto que, invariavelmente, todos gostam muito dos conceitos e têm a intenção de implantar, mas nem todos os implantam.
Estudando o assunto, vi que este fenômeno (a intenção de fazer alguma coisa e a sua não efetiva realização) é bastante comum a todo ser humano. Um trabalho recente realizado na Holanda levantou junto aos produtores de leite qual era a intenção deles em reduzir a CCS dos seus rebanhos e foi observado que 92% responderam positivamente, mas, de fato somente 12% conseguiram o intento (The Role of Communication in Improving Udder Health in Veterinary Clinics of North America Food Animal Practice 28(2):363-79 · Junho 2012).
No caso do Sistema MDA, fizemos uma pesquisa para entender as causas da não implantação do sistema na sua totalidade e chegamos a 5 principais causas:
1. LÍDER AUSENTE
2. QUERER ORGANIZAR O PROCESSO E DESMOTIVAR AS PESSOAS
3. COMEÇAR BEM E DEPOIS DESANIMAR
4. DIFICULDADE AO PADRONIZAR UM PROCESSO
5. NÃO CUMPRIR A SUA MISSÃO
Vou falar um pouco mais sobre cada uma destas causas.
1. LÍDER AUSENTE
Líder ausente é aquela situação em que o dono, após tomar conhecimento do Sistema MDA, fica muito empolgado para implantá-lo, convoca todos os empregados, inclusive o gerente e o consultor e discursa que quer tudo funcionando rapidamente. Incentiva o pessoal, fala da importância da sua implantação, que a produção vai aumentar, os custos vão cair, todo mundo vai trabalhar feliz e engajado, mas ele próprio não muda seu comportamento. Não acompanha os trabalhos, não analisa os resultados dos processos, não faz as reuniões semanais e mensais. Ou seja, continua a se comportar exatamente como se comportava anteriormente. Normalmente isto acontece por falta de tempo. Em nossos trabalhos vimos que os produtores utilizam somente 25% do tempo em coisas que chamamos “importantes mas não urgentes”, que são justamente aquelas relacionadas ao gerenciamento do negócio. No entanto, deveriam utilizar mais de 50% do tempo nestas tarefas. Para que esta mudança ocorra, há necessidade de reorganizar a agenda pessoal tendo claro a visão do negócio.
2. ORGANIZAR O PROCESSO E DESMOTIVAR AS PESSOAS
Uma das principais causas é a de não entender os fatores desmotivadores das pessoas. Em nossos levantamentos vimos que a falta de participação nas decisões de como realizar as tarefas é a causa principal de desmotivação dos empregados. Os empregados (operadores) são aqueles que de fato conhecem as limitações na execução das tarefas. Eles conhecem as vacas, os equipamentos, as instalações, o clima e as demais pessoas. Quando vem uma pessoa de fora, por exemplo um consultor, e este define como as tarefas devem ser feitas, causa grande desconforto entre os empregados, levando a baixo moral e desengajamento com os resultados. Os empregados, como dizemos no Sistema MDA, são os experts nos processos e, obrigatoriamente, devem participar na definição dos procedimentos operacionais.
3. COMEÇAR BEM E DEPOIS DESANIMAR
Isto é muito comum em vários aspectos de nossas vidas. Começamos a fazer regime e paramos em seguida; começamos a fazer ginástica e paramos em seguida. É comum. Para mim, a principal causa deste fato é a falta de um problema concreto que leve a um propósito mais nobre e que entusiasme a todos. Quando temos um problema concreto, como uma doença por exemplo, fica muito mais fácil aderirmos ao tratamento. No caso da pecuária de leite, os produtores não conseguem definir claramente o problema que tem. Dizem que são os empregados, a falta de recursos, o preço do leite, o custo de produção, o governo, o clima, o barro, a seca, etc. Deveríamos olhar a situação de outra maneira. Ao invés de focarmos nos problemas, deveríamos analisar onde queremos chegar, nossa visão. Se, por exemplo, a visão do dono for a de ter um negócio arrumado, organizado, onde todos trabalhem felizes, onde todos tem segurança graças ao atendimento das necessidades do mercado, os problemas passam a ser oportunidades e desafios, envolvendo a todos em um propósito mais nobre.
4. DIFICULDADE AO PADRONIZAR UM PROCESSO
Um dos princípios do Sistema MDA é reduzir a variação dos resultados. Para tanto, é preciso padronizar as tarefas dos processos, o que é conseguido através da elaboração de procedimentos operacionais (POs) e muito treinamento. Tudo certo, porém, algumas vezes as pessoas escrevem procedimentos que somente quem escreveu os entende e, além disso, os armazena em locais inacessíveis a quem de fato os utiliza. Isto leva a total desalinhamento do que é escrito com o que é feito. Mas, com o tempo, as tarefas vão sendo naturalmente alteradas sem que seja refeito o que está escrito e acaba-se abandonando a ferramenta, retornando ao estado original. Nós da Clínica do Leite estamos trabalhando muito atualmente nesta área pois acreditamos que é fundamental que se cumpra os POs. Para tanto, é preciso trabalhar para facilitar as tarefas e desenhá-las de maneira que seja prazeroso utilizar as ferramentas pelos empregados. Esta é uma nova ciência chamada de Design Thinking que estamos empregando para engajar os empregados.
5. NÃO CUMPRIR A SUA MISSÃO
Bom resultado se consegue fazendo as coisas certas na primeira vez. Para tanto é preciso que os operadores executem as tarefas como combinado, que os supervisores (quando houver), acompanhem os operadores e corrijam imediatamente as tarefas executadas inadequadamente. Que os gerentes acompanhem o trabalho dos supervisores e analisem os resultados de maneira a identificar problemas não percebidos visualmente, que sejam identificadas as causas raízes dos problemas e elaboradas as contramedidas para eliminá-las definitivamente. Uma vez ao mês o dono deve verificar se os interessados nos negócios (clientes, proprietários, empregados e sociedade) estão com suas necessidades atendidas e, se não, medidas corretivas devem ser tomadas. Notem que cada função na fazenda tem uma missão muito bem clara e distinta. Uma das causas da não implantação é a dificuldade em organizar isto. Muitas vezes não é feito por falta de uma ferramenta, outras, por falta de disciplina. Mais uma vez, nesta área, estamos iniciando um trabalho que acreditamos que será muito frutífero. Ele envolve um Sistema de Informações e de Comunicação que manterá o produtor e todos os envolvidos na fazenda conectados às suas tarefas.
Agora temos mais claro as razões pelas quais os produtores não implantam o Sistema MDA na sua totalidade. Desta forma, estamos focados em melhorar. A propósito, este é um dos princípios do Sistema MDA: a melhoria contínua. Acreditamos que, com novas ferramentas, conseguiremos facilitar a implantação da gestão nas fazendas, reduzir barreiras e fazer com que os produtores tenham mais sucesso.
Fonte: Milkpoint
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