A combinação do milho com leguminosas resulta em um produto mais equilibrado nutricionalmente
O Brasil, como país tropical, possui estações bem definidas, sendo caracterizado pela época das águas (verão) e época de estiagens (inverno). Durante esse período de estiagem, a disponibilidade de água nas pastagens diminui drasticamente ou, em alguns casos, cessa completamente, além de ocorrer fotoperíodo, com dias mais curtos e noites mais longas. Essas variações impactam diretamente o valor nutritivo das pastagens, resultando em flutuações na qualidade da alimentação disponível para o rebanho.
Diante deste cenário, o planejamento de estocagem das forrageiras durante os períodos de maior oferta, revela-se a melhor alternativa para os produtores enfrentarem a seca. A conservação das forragens pode ser feita por meio da fenação, que consiste na desidratação da planta com a manutenção do valor nutricional, ou pela ensilagem, processo em que a fermentação láctica resulta na silagem.
Ao escolher a cultura a ser ensilada, devem-se considerar fatores como o teor de matéria seca no momento do corte, capacidade tampão e nível de carboidratos solúveis.
O milho é amplamente utilizado para produção de silagem em todo o mundo, apresentando condições ideais para um produto de alta qualidade. No momento do corte, o milho pode atingir bom teor de matéria seca, além de possuir baixa capacidade tampão e níveis ideais de carboidratos solúveis, que favorecem uma fermentação adequada (Souza et al., 2019). No entanto, o milho tem como desvantagem baixo teor protéico, que varia entre 6 % a 9 % de proteína bruta.
Por sua vez, as leguminosas são conhecidas por seu alto teor protéico, em média 20 % de proteína bruta, e são freqüentemente usadas como banco de proteína em propriedades rurais. No entanto, essas plantas apresentam alguns desafios na produção de silagem, como alta capacidade tampão, baixos níveis de carboidratos solúveis, alto teor de lignina em leguminosas arbóreas e baixo teor de matéria seca. A utilização de leguminosas arbóreas para produção de silagem acaba sendo inviável pela dificuldade durante a colheita e processamento, logo, as leguminosas herbáceas são preferidas para a produção de silagem.
Considerando esses aspectos, a consorciação entre culturas tem ganhado cada vez mais espaço. A combinação do milho, que oferece boas características para a produção de silagem, com as leguminosas, que aumentam o teor protéico, resultando em um produto mais equilibrado nutricionalmente. Além disso, as leguminosas têm a capacidade de fixar nitrogênio no solo, graças à presença dos rizóbios em suas raízes, o que reduz a necessidade de fertilizantes.
Pesquisas recentes, como a de Silva et al. (2023) investigaram diferentes níveis de inclusão do feijão-guandu na silagem de milho, obtendo resultados significativos. O estudo indicou que a inclusão de até 40 % de feijão-guandu na silagem de milho resultou em teor de 97,4 g por kg de proteína bruta. Durante o processo de fermentação, a proteólise, que normalmente reduz o teor de proteína bruta, foi compensada pela adição do feijão-guandu, mantendo-se os níveis de proteína bruta e possibilitando uma redução de custos com suplementos protéicos.
Leguminosas também podem ser consorciadas com as gramíneas, como evidenciado por Ebro et al. (2024) que estudaram diferentes níveis de inclusão de leguminosas na silagem de capim Napier e observaram um aumento no teor de proteína bruta. Com o aumento da inclusão de leguminosas, foi constatado um aumento do pH da silagem devido as leguminosas apresentarem alta capacidade tampão. Mesmo assim, os níveis de pH permaneceram dentro dos limites adequados para a conservação da silagem, abaixo de 4,5.
Ligoski et al. (2020) estudaram a consorciação de silagem de milho, feijão-guandu e capim Marandu, obtendo maiores teores de proteína bruta, fibra em detergente ácido e lignina em relação ao monocultivo de milho. Enquanto a silagem de milho em monocultivo apresentou em média 5 % de proteína bruta, a silagem consorciada alcançou 6 %. O aumento nos teores de fibra em detergente ácido e lignina é justificada pela presença do capim Marandu implantado na consorciação, onde esta forrageira modifica a sua fisiologia em ambientes de luz reduzida, apresentando aumento de colmos e de folhas em busca de luz.
Costa Araujo et al. (2023) concluíram que o cultivo consorciado de milho com C. ochroleuca, plantado na entrelinha melhorou o processo fermentativo e qualidade nutricional da silagem, com aumento no teor de proteína. No entanto, a consorciação deve ser feita com atenção à competição entre as espécies, sendo essencial escolher cultivares que tenham fisiologia e taxa de crescimento compatíveis.
A utilização de cultivar consorciada para produção de silagem oferece aos produtores um melhor aproveitamento das áreas, redução de custos com fertilizantes, recuperação das áreas degradadas, aumento da matéria orgânica do solo e melhorias nas características biológicas do solo. Além disso, possibilita diminuição significativa nos custos com a nutrição animal, já que o alimento produzido apresentara melhor composição bromatológica.
Diversas pesquisas já demonstraram a eficácia da consorciação, com grande potencial para ser amplamente disseminada em todo o Brasil. Os sistemas de consorciação para a conservação de alimentos tornam-se uma prática sustentável, apresentando-se como uma tecnologia inovadora que contribui para a redução dos impactos ambientais e para a melhoria da nutrição animal.
FONTE: Milkpoint por Guilherme Henrique Salgado, Marco Antônio Pereira da Silva, Wildo Pereira Matos, Bruno de Souza Marques e Luiz Felipe Diniz Aniceto e Silva