Os probióticos podem ser importante aliado na saúde do seu animal
Foto Wagner Correa
Você já deve ter ouvido falar em probióticos para humanos, pois bem, eles podem ser encontrados em iogurtes, bebidas lácteas fermentadas, entre outros produtos. E aí, o que isso tem haver com gado de leite? Para quem não sabe, eles também são utilizados para animais e podem ser uma ótima ferramenta na saúde de suas vacas. E para ambas as situações o objetivo é o mesmo: melhor saúde digestiva.
O Médico Veterinário pela UFU, Doutor em Ciência Animal e Pastagens pela USP/ESALQ, Lucas Mari fala com exclusividade ao Jornal Holandês. Ele explica sobre os tipos e efeitos dos probióticos, mostram pesquisas e ganhos na produtividade. “Embora seja um conceito “novo” no mercado leiteiro, os probióticos são centenários em suas ações. Podem (e devem) ser usados por todos, humanos e animais, mas ressalto que existem probióticos e probióticos, assim como existem pessoas e pessoas, também existem vacas e vacas”, comenta Lucas.
Probióticos ou leveduras? Vivos ou mortos? Acompanhe a nossa entrevista e aproveite para tirar essas e outras dúvidas.
JORNAL HOLANDÊS: O que são os probióticos?
LUCAS MARI: Probióticos são microrganismos vivos que promovem efeitos benéficos em humanos ou nos animais. Vem da junção da preposição de origem latina pro = “em favor”, associada à palavra grega bios = “vida”. Usualmente, na nutrição animal, são leveduras vivas ou bactérias. O conceito foi primeiramente usado por um pesquisador russo chamado Metchnikoff (1908) que pela primeira vez propôs que o uso de bactérias do gênero Lactobacillus seria benéfico ao hospedeiro. Esta proposição deu-se por observações de que alguns habitantes da Bulgária seriam mais longevos. Isso seria consequência do consumo de uma bebida láctea fermentada contendo Lactobacillus que os ajudariam no controle de bactérias intestinais indesejáveis.
JH: Por que muitos não conhecem?
LM: Até acho que muitos conhecem, mas como se diz, “não ligam o nome à pessoa”. Mesmo para humanos usa-se probióticos, eles podem ser encontrados em iogurtes, bebidas lácteas fermentadas etc. Há até um medicamento composto de leveduras vivas que ajuda na recomposição da flora e controle de diarreia muito usado em humanos. Genericamente, para gado leiteiro se fala em “leveduras”, assim, também acho que já devem ter ouvido falar.
JH: Seria a mesma coisa os probióticos para os humanos?
LM: Exatamente! Embora comparativamente aos ruminantes os efeitos sejam distintos, pois o trato gastrintestinal desses últimos é muito diferente, mas o objetivo é o mesmo, ou seja, melhor saúde digestiva. O uso de probióticos em monogástricos (suínos, aves, peixes, humanos e, inclusive, bezerras) tem objetivos semelhantes. Existe uma levedura específica chamada Saccharomyces cerevisiae boulardii (Levucell® SB) que é usada em humanos de qualquer idade para controle da diarreia e temos um produto com a mesma base probiótica para bezerras, com resultados também comprovados.
JH: Como é a sua utilização no exterior?
LM: O uso desses probióticos em países de excelência na produção leiteira é muito mais difundido. Como exemplo pode-se citar que nos EUA, de acordo com dados do Prof. Mike Hutjens da Universidade de Illinois, o uso de leveduras vivas ou cultivo de leveduras chega a mais de 30% do rebanho, os probióticos contendo bactérias estão presentes em cerca de 10% a 15% do rebanho. Na Europa, embora muito variável de país para país, creio que o uso, sobretudo de leveduras vivas seja até maior que nos EUA. A particularidade da Europa faz com que o uso desses probióticos seja mais difundido é que os antibióticos usados como promotor de crescimento/ionóforos são proibidos desde o ano de 2006. E a pressão para a redução do uso indiscriminado de antibióticos é cada vez maior no mundo inteiro, por isso, penso que num futuro próximo o uso de probióticos seja mais e mais comum também no Brasil.
JH: Como andam os estudos?
LM: Na Lallemand temos sempre mantido estudos de nossos produtos, em especial nossa levedura viva Levucell® SC. Nem tanto mais para entender o mecanismo de ação, pois já está bem conhecido, mas em pesquisas aplicadas. O foco mais recente verificado foi a melhoria da digestibilidade da fibra em animais suplementados com leveduras vivas. Inclusive com um estudo bastante importante realizado na FMVZ da USP de Pirassununga. Melhorando a digestibilidade de fontes de forragens tropicais bastante difundidas no nosso país: pasto de Marandu, pasto de Mombaça, feno de Tifton 85, silagem de milho e silagem de cana-de-açúcar. Em todos eles houve maior digestão da fibra com o uso de nossa levedura viva. E outra evidência recém-observada é que o rúmen mais saudável, consequência do uso da levedura viva, trouxe como benefício a diminuição do efeito deletério de micotoxinas às vacas suplementadas.
JH: Como eles funcionam no organismo do animal?
LM: A levedura específica de ruminantes trabalha diretamente no rúmen. Controla o pH ruminal, consome oxigênio que pode estar presente dentro do rúmen, mesmo que em baixa concentração, estimula bactérias que consomem lactato, também ajudando a controlar o pH. Como consequência, há maior população de bactérias fibrolíticas e aumento da digestão da fibra, controle de acidose e suas consequências produtivas e de saúde das vacas.
Já a levedura que comentei acima que é usada em bezerras tem ação muito distinta. Promove a aderência de patógenos flagelados (E. coli e Samonella sp.), neutraliza algumas toxinas produzidas por outras bactérias, estimula a resposta imune etc. Seu local de atuação é no intestino. É justamente no intestino o maior desafio dos animais nessa fase inicial de sua viva.
JH: No mercado, há vários tipos de probióticos. Fale sobre eles.
LM: Você tem razão, mas a grande diferença está na composição de microrganismos. Há aqueles que têm como base leveduras e outros que têm bactérias em sua composição. É importante que seja microrganismos vivos. Há muitos produtos de mercado que utilizam o apelo de microrganismos, mas não são probióticos, pois são mortos. Há muita levedura sendo considerada probióticos de maneira errônea, pois são leveduras mortas, subprodutos da produção de etanol e cerveja.
JH: Como o criador identificará qual o melhor para a sua propriedade?
LM: O principal ponto a observar é que seja um produto provado, que mostre resultados científicos. O fornecedor do produto deverá mostrar as pesquisas e o produtor deverá ser crítico nessa questão. Não basta o vendedor apenas falar que é um bom produto, ele tem que mostrar as provas científicas que dão essa segurança. Houve muito produto também que tem o apelo de marketing de ser probióticos que nunca foi provado por pesquisadores independentes.
JH: Qual a porcentagem que o criador deve utilizar?
LM: Isso é um pouco variável, pois cada empresa produtora de levedura tem sua cepa, ou seja, sua estirpe própria, cuja recomendação varia. Mas normalmente se utilizam ao redor de alguns gramas de produto, até cerca de 20 g/vaca/dia.
JH: Mudança de clima interfere nos resultados?
LM: Sim, não só o clima, mas também qualquer variação no manejo alimentar, por exemplo. A respeito do clima existem trabalhos que mostram o efeito benéfico do uso de levedura viva para dar suporte aos animais no período do calor. Não que só deva ser usada no período de estresse térmico, mas nesse período a levedura ajuda a manter o ambiente ruminal mais equilibrado, graças a todos os seus efeitos no metabolismo ruminal.
JH: Como eles agem segundo a idade do animal?
LM: Em parte sim, o uso de leveduras em animais jovem tem dois objetivos. O primeiro objetivo é o uso da levedura da espécie Saccharomyces cerevisiae boulardii para melhorar a saúde intestinal. Mas também há resultados científicos do uso da nossa outra levedura, exclusiva para ruminantes com o objetivo de desenvolvimento mais precoce do rúmen. Após o desmame a levedura age controlando o pH do rúmen (controla acidose, diminui laminite nutricional), aumenta digestão da fibra e, em última análise, melhora a eficiência alimentar, ou seja, produz mais leite com a mesma quantidade de alimento fornecido.
JH: Como eles influenciam na produção de leite? Interfere na qualidade do leite?
LM: A manutenção do ambiente ruminal equilibrado facilita a digestão dos alimentos pelas bactérias ruminais. Além disso, o organismo animal “gasta” menos energia para combater às doenças, “sobrando” mais energia destinada à produção de leite.
Sim, há interferência na qualidade do leite, de maneira direta e indireta. De forma direta pelo aumento na digestão da fibra, o que aumenta a produção de ácido acético dentro do rúmen, o precursor de gordura do leite. De forma indireta, pois as maiores populações de microrganismos ruminais favorecem o maior aporte de proteína metabolizável no intestino das vacas, levando ao aumento da concentração de proteína do leite. E também, indiretamente, tendo uma saúde melhor ruminal, menor circulação de agentes infecciosos com diminuição da CCS do leite.
JH: A raça Holandesa possui algum resultado diferenciado na utilização dos probióticos?
LM: Os benefícios do uso de leveduras ou outros probióticos são independentes da raça, portanto, a raça Holandesa não se mostra com resultado diferenciado de outras raças leiteiras. Mas o que é importante destacar que a maior parte das pesquisas é conduzida com animais da raça Holandesa, por ser a raça mais especializada em produção de leite.
JH: Qual o custo benefício na utilização dos probióticos?
LM: Nossos estudos científicos demonstram melhoria da eficiência alimentar de 65 g de leite a mais para cada kg de matéria seca ingerido pelos animais. Isso é dizer que uma vaca que consuma cerca de 20 kg de MS/dia, teria sua produção de leite aumentada em 1,3 kg/animal/dia, comparativamente aos animais que não receberam a levedura viva. O produto se paga com o aumento de produção da ordem de 250 mL/dia, portanto seu uso tem relação benefício-custo muito favorável, superior à R$ 5,00 retornados para cada R$ 1,00 investido. É importante deixar claro que isso é resultado de mais de 30 estudos que fizemos nos mais diversos centros de pesquisa do mundo todo, alguns deles realizados no Brasil, em nossas condições, com nossas forragens e dietas. Sem dúvida é um resultado de pesquisa muito consistente.
JH: Quais são as desvantagens?
LM: Vejo como desvantagem o desconhecimento de produtores, comunidade e, até mesmo de técnicos de ciências agrárias sobre o tema. Generaliza-se muito o termo “probióticos” sendo que há uma gama imensa de microrganismos que podem ser classificados como probióticos. Há bactérias, levedura e fungos e, obviamente, todos eles têm ação distinta. Uma grande desvantagem também é que algumas vezes já houve algum uso de “probiótico” pelo produtor e pode ter sido mal indicado e “queimou-se o conceito”.
VANTAGENS DOS PROBIÓTICOS
• São produtos naturais – podem ser usados sem problema algum nas mais diversas explorações, orgânicas ou não, sem comprometimento da saúde.
• São alternativas ao uso de antibióticos promotores de crescimento – com a iminência da redução do uso de antibióticos para produção animal usado como promotores de crescimento, os probióticos são ótimas alternativas.
• Se usado em conjunto com antibióticos, os probióticos com base em leveduras vivas (Saccharomyces cerevisiae e Saccharomyces cerevisiae boulardii) não sofrem interferência, pois os antibióticos não atuam contra leveduras. Isso não é verdade com relação a algumas bactérias. Alguns antibióticos são de amplo espectro de ação e, podem interferir na viabilidade de bactérias probióticas.
• Interferem não só nas ações do trato gastrintestinal, mas também na resposta imune dos animais.
• Já se conhece muito de seu mecanismo de ação, portanto é um produto embasado cientificamente falando.
• Não necessitam de período de carência e descarte do leite ao ser usado.
• Não há dose máxima e intoxicação pelo uso.