“Como eu posso produzir leite no sistema de produção à pasto em dias de muita chuva se a pastagem é em céu aberto?”
MARCO AURÉLIO FACTORI | Zootecnista
Hoje iremos falar de um assunto difícil. Pois bem, como eu gosto de contar histórias vamos a mais uma. Conversei alguns dias atrás com um colega que recentemente comprou uma moto, sim, uma moto. Em si nenhum problema, se não fosse para ele o vento e a chuva. Quando falamos em vento logo associamos ao frio, e em regiões muito quentes do nosso país, um ventinho mais frio pode até ajudar.
Mas a chuva, em se tratando de moto (voltando a história da moto) é um mal sinal. Sim, mal sinal. Este meu amigo me diz sempre que gosta de moto pois gosta de sentir o vento batendo no rosto, mas em se tratando de chuva isto não é muito agradável. Este meu amigo tem pego estes dias muita chuva, segundo ele. Então eu sugeri: já pensou em uma capa de chuva?
Pessoal, voltando agora para a produção de leite em pasto para dias de chuva, sim, é um fator desagradável uma vez que o produtor precisa sair na chuva para trazer o gado ou quando falamos da lama que se acumula na entrada da ordenha. Em dias assim, a vaca acaba diminuindo o leite e os problemas acabam se estendendo.
Para a produção de leite ocorrer, dentro da vaca, especialmente no rúmen, a ingestão de massa verde – e sobretudo seca – deve ocorrer em consonância para atender as exigências do animal.
A massa verde ingerida pela vaca nada mais é do que tudo que a vaca come, contabilizando também a água (não a do bebedouro e sim a do alimento). O capim apresenta aproximadamente 80% de água e apenas 20% de massa seca – proteínas, gorduras, etc.
Sabendo disso, ao ingerir o alimento, além dos ingredientes propriamente ditos o animal ingere água. Enfatizando o porquê de que quando o animal come um alimento mais verde acaba consumindo menos água de bebedouro. Se isso acontece, a explicação é muito simples: ao ingerir um material mais verde, o alimento vai conter mais água e por isso a vaca precisa beber menos água no bebedouro.
Na chuva o animal ingere além da água contida dentro do alimento, ele bebe, forçadamente, a água de fora do capim, afinal o capim está molhado, certo? Ao ingerir esta água – afinal o animal vai se alimentar normalmente, pois ele tem fome – o animal acaba ingerindo uma quantidade de água relativamente alta, o que acaba preenchendo um maior espaço físico no trato digestivo do animal.
Sendo assim, por ingerir mais água o espaço disponível é ocupado com água e não com o alimento. E o que isso significa? Menos ingestão de nutrientes. Sabe aquela sensação de comer dois pratos de sopa e logo sentir fome?
Então pessoal, um fator muito simples de se explicar é a diminuição de leite em função da chuva. Não somente pela menor quantidade de alimento como um todo ingerido, mas a proporção do ingerido também é preocupante. Mas como assim?
Espero que concordem comigo, mas ao ingerir mais água com o capim e cocho molhado, o animal pode perder os alimentos de partículas menores como a ração por exemplo e por isso acabam desajustando o balanceamento da sua dieta diária. Neste ponto, o animal poderá ingerir mais ou menos proteína e assim, pode até desregular a relação da proteína e gordura do leite.
Muitos são os casos de procura por produtores que em momentos de chuva são acometidos por um problema corriqueiro, denominado leite ácido. Na maioria das vezes esta acidez no leite é causada por contaminações no leite, acarretando prejuízos para produtores.
Em alguns casos, o desbalanceamento da dieta causa alterações na relação da proteína e gordura do leite, causando um efeito chamado Leite LINA (Leite Instável e Não Ácido). Este problema é rapidamente solucionado pela correção da dieta. Este problema também é comum em trocas de dietas ou entrada e saída do verão e inverno. Isso porque a maioria dos produtores se equivocam nas dietas dos animais, ou até mesmo por falta do volumoso, o que acaba acarretando estes problemas nos animais.
Aproveitando o gancho, será que seria correto adicionar água na dieta dos animais para eles comerem mais? A resposta nem sempre é sim. Como eu disse, ao acrescentar água na dieta podemos atrapalhar a ingestão da dieta correta.
Vocês podem estar se perguntando: os animais não comem uma quantidade maior de silagens úmidas, ou dietas mais úmidas, por exemplo? Será que o ‘comer mais’ não é uma defesa do animal? Afinal, o ‘ingerir mais’, é devido o alimento estar molhado e a ingestão de massa seca e de nutrientes ser menor e o animal acaba compensando na quantidade. Já pensaram nisso? Isto é verdade.
Mas então, o que fazer na chuva com os animais para que não aconteçam estes problemas? Pessoal, gosto muito de dizer sempre que chuva é sempre bem-vinda. Embora, as vezes faça estragos, o poder da chuva é maior, pois, frutifica e dá vida às plantas que servem de alimentos para os animais.
Então, desta forma, ao invés de pararmos os ventos, que tal ajustarmos as velas? Sim, ajustes a velas.
Sabe como fazemos isso? Voltando ao meu amigo motociclista, será que uma capa de chuva resolve? Olhar a previsão do tempo? Talvez esperar um pouco a chuva passar, chegar atrasado mas chegar? Que tal ir de ônibus naquele dia?
Senhores, muitas coisas relacionadas a chuva nós podemos prevenir. Colocar areia na entrada da ordenha ou aumentar a drenagem, já ajuda. Ter pelo menos o cocho coberto para que não molhe os alimentos auxilia para os animais ingerirem uma ração sem água de chuva. E por fim, pastejo na hora certa, antes da chuva ou após a chuva – depois que escorreu um pouco da água – ajuda também. Ajustar o concentrado, aumentando ou diminuindo a proteína, contribui.
Aumentar 0,5kg de ração, será que atrapalha menos a queda da produção de leite? Sabendo disso o produtor rural deve estar antenado. Sabe como? Veja a previsão do tempo. Arrume a goteira do telhado. Aumente a drenagem da entrada do curral. Corrija a dieta dos animais. Faça alguma coisa para amenizar o problema, isto seria a atitude correta.
Enfim, dá para andar de moto na chuva sim. Vai mais devagar, olhe mais a diante. Tente prever o problema. Enfim, olhe para a vaca, ela pode estar conversando como você e falando: “Olha só, eu estou molhada!”
Fonte: Milkpoint