Água, vento, tempo e uma vaca: é tudo o que você precisa para resfriar seu rebanho leiteiro no verão

Israel Flamenbaum | 
Especialista no estudo do estresse térmico em vacas leiteiras, professor na Hebrew University of Jerusalém, ministra cursos e treinamentos sobre o assunto em diversos países

Foto Fazenda Figueiredo

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Durante minhas atividades de consultoria, visito muitas fazendas, especialmente aquelas localizadas em “regiões quentes” do mundo. As visitas têm como foco os esforços para reduzir o impacto negativo do estresse térmico de verão na performance das vacas.
Algumas fazendas que visito não dispõem de nenhum meio de resfriar suas vacas no verão e necessitam partir do início. O “resfriamento de vacas” é um dos tópicos mais estudados nos últimos anos por pesquisadores de universidades e instituições de pesquisa em países quentes e publicados em artigos científicos e populares. Com base nas informações obtidas, ministros da agricultura e organizações de fazendeiros publicaram livros e boletins de recomendações, fornecendo instruções para uma adequada instalação e operação de sistemas de resfriamento para vacas no verão.
Infelizmente, apesar do extenso conhecimento publicado sobre o tópico de resfriamento de vacas e o fácil acesso de produtores à informação, somente uma pequena parte das fazendas de gado leiteiro que visitei até hoje usam adequadamente seus sistemas de resfriamento e obtêm os resultados esperados. O índice de “relação verão-inverno” tem sido usado há mais de uma década no setor leiteiro de Israel e é uma boa ferramenta para avaliar a capacidade do gado leiteiro de lidar com sucesso com o estresse térmico.
Os dados publicados em Israel nos últimos anos indicam uma ampla variação no índice em termos de produção de leite e taxa de concepção, entre diferentes fazendas. Em média, as fazendas leiteiras de Israel produziram 4% menos leite no verão (julho – setembro) de 2013, quando comparadas ao inverno (janeiro – março). O grau da redução foi superior a 20% em algumas das fazendas, enquanto que em outras não houve nenhuma redução. No mesmo ano, a média nacional da taxa de concepção no verão alcançou 26%, variando entre 5% em algumas fazendas leiteiras e 40% em outras.
O que faz a diferença entre fazendas de gado leiteiro em relação à performance das vacas no verão?
É provável que algumas das diferenças se encontrem na localização geográfica e topográfica das fazendas leiteiras, no tipo de alojamento e na densidade de vacas no interior das construções, bem como no tipo de alimentação e na frequência com que esta é distribuída às vacas. Contudo, em minha opinião, o fator que causa o maior impacto na performance das vacas no verão é a “qualidade do resfriamento”.
Recentemente, me perguntei quais eram as características do que chamamos “qualidade de resfriamento”, e a resposta que dei consiste nas quatro palavras presentes no título deste artigo: água, vento, tempo e a vaca.
Neste artigo, gostaria de desenvolver cada um destes quatro fatores e sua contribuição à qualidade de resfriamento. Em minha experiência, aprendi que somente uma aplicação completa e uma combinação correta de todos estes fatores permite alcançar um resfriamento adequado às vacas no verão e alcançar os resultados produtivos e reprodutivos esperados, conforme mencionado acima.

Água
Em nosso caso, não é somente a água para beber, embora esta questão seja de grande importância para as vacas no verão. No mínimo 10 cm de área de bebedouro por vaca com água limpa e fresca são recomendados em regiões quentes, para atender as necessidades das vacas, preferencialmente de forma bem distribuída ao longo do estábulo.
A água neste caso é aquela para o processo de resfriamento. A combinação de água e ventilação forçada é a melhor forma de resfriar as vacas. A evaporação de água do corpo dos animais permite uma perda térmica cinco vezes maior do que aquela alcançada somente pela ventilação ou pela água.

Como molhamos as vacas adequadamente?

Vários fatores influenciam a qualidade com a qual as vacas são molhadas, entre as quais o tamanho das gotas e a força com que penetram na superfície do corpo das vacas, que dependem do tipo e da distância dos aspersores utilizados.
Gotas muito pequenas podem não penetrar o pelo das vacas, impedindo o contato entre a água e a pele das vacas, afetando o resfriamento. Até mesmo ventos laterais naturais soprando perpendicularmente às gotas podem desviar a água para os lados, mantendo a vaca seca.
A frequência com que são molhadas também é um fator importante. Estudos demonstram que a aspersão de água combinada com ventilação forçada a cada 5 minutos resultam em um resfriamento máximo, enquanto que a aspersão em intervalos maiores reduz a qualidade do resfriamento.
Portanto, a primeira condição para que se atinja um bom resfriamento é os animais serem molhados adequadamente.

Vento
Uma evaporação adequada da superfície da vaca, especialmente em regiões úmidas, requer a ventilação de alta intensidade das vacas. Neste ponto, novamente, a pesquisa nos deu um auxílio e descobriu que a ventilação forçada a uma velocidade de 3 metros por segundo, quando combinada com aspersão de água a cada cinco minutos, poderia resultar em um resfriamento ótimo.
Minha recomendação é que todas as fazendas produtoras de leite tenham um anemômetro e posicionem os ventiladores na sala de espera, pista de alimentação e área de descanso de acordo com a velocidade do vento gerada pelos ventiladores. Ademais, em relação à operação dos ventiladores, os ventos laterais naturais podem ter um maior impacto na qualidade da ventilação.
Em minha experiência, tais ventos podem diminuir a velocidade do vento gerado pelos ventiladores pela metade na pista de alimentação, sala de espera ou área de descanso. Para evitar o impacto negativo destes ventos naturais no verão, recomenda-se bloqueá-los através de cortinas ou paredes feitas de materiais mais sólidos e que possam ser removidos no inverno.

Tempo
O fator tempo é muito importante para o sucesso do resfriamento das vacas. Refere-se ao total cumulativo de horas durante o dia para as vacas serem resfriadas no verão, bem como os intervalos entre as sessões de resfriamento.
As vacas de alta produtividade geram mais de 2.000 watts de calor e, para liberá-lo ao ambiente através do resfriamento, elas precisam ser intensamente resfriadas por um longo período durante o dia.
Um grande erro é pensar que resfriar as vacas por alguns poucos minutos antes de cada sessão de ordenha seja suficiente para resfriá-las. Com base em estudos recentes, sabemos que para dissipar a maior parte do calor gerado pelas vacas de alta produtividade durante o dia, é necessário resfriá-las por 4 a 6 horas seguidas por dia, e pelo maior número de vezes possível.

 

Qual a duração ótima de cada sessão de resfriamento?

Não há uma resposta exata e é provavelmente diferente entre uma fazenda e outra e provavelmente depende das distâncias que as vacas precisam caminhar na ida e na volta da sala de ordenha e/ou sala de resfriamento.
A exposição das vacas à radiação solar direta em corredores sem sombra, bem como a densidade de vacas na área de resfriamento podem influenciar a qualidade de resfriamento e, portanto, a duração ótima das sessões de resfriamento.
Estudos realizados em Israel demonstram que sob condições em que as vacas não necessitam caminhar longas distâncias ao sol, a duração ótima de cada sessão de resfriamento pode ser de 25 minutos, combinando ventilação forçada contínua e aspersão de água por um curto período (30-40 segundos), a cada 5 minutos, quando o tratamento for fornecido 8 vezes por dia (a cada três horas, em média, 200 minutos de resfriamento por dia).
Isto também vale para fazendas onde as vacas caminham longas distâncias para serem ordenhadas e/ou resfriadas?
Não sabemos ainda e atualmente estamos levantando estes dados em fazendas leiteiras de grande escala, localizadas em uma região quente do norte do México.

Vaca
Este é certamente o fator mais importante desta história.
Tudo o que foi descrito até este momento teve como objetivo promover seu resfriamento adequado. Contudo, temos a certeza de que a vaca se encontra no local e na hora certa para receber o tratamento no qual investimos tanto?
A presença da vaca no local de resfriamento é, em minha opinião, o fator mais importante, determinando a qualidade do resfriamento e a principal causa das diferenças de respostas das vacas ao tratamento.
Isto é especialmente verdadeiro naquelas fazendas em que as vacas são resfriadas na pista de alimentação, de modo que o resfriamento ocorre sem que as vacas estejam presas, ou seja, sem garantia de que estejam presentes no local de resfriamento durante a operação. Mesmo quando as vacas são presas na pista de alimentação durante o resfriamento, a qualidade pode ser diferente entre as vacas situadas nas “áreas” com melhor ou pior cobertura de resfriamento, resultante da localização dos ventiladores ou aspersores em relação a uma vaca específica.
O mesmo se aplica ao resfriamento na sala de espera ou sala de resfriamento especial, onde o grau de cobertura pode diferir de uma vaca para a outra na mesma sala, dependendo de onde a vaca está.

Conclusão
Até este ponto, conclui-se que há muitos fatores que podem afetar a qualidade de resfriamento e, portanto, a forma como a fazenda lida com o estresse térmico no verão. Fica claro que somente ao combinar uma operação adequada simultaneamente com todos os fatores acima mencionados pode-se obter os resultados esperados e o retorno do investimento no sistema de resfriamento.
Recentemente, começamos a usar uma tecnologia simples e barata para monitoramento de mudanças diurnas na temperatura corporal das vacas, com uso de termômetros colocados em dispositivos intravaginais (CIDR). Recomendo o uso destes termômetros para avaliar a eficácia do sistema de resfriamento e seu gerenciamento. Recomendo inserir pelo menos cinco dispositivos simultaneamente em um grupo de vacas (e 10 unidades seriam ainda melhor). As informações obtidas nos dirão se as vacas foram suficientemente resfriadas e, no caso de uma variação muito grande entre as vacas, será um sinal de que o tratamento não está uniforme e há espaço para melhorias.
O estudo do custo-benefício do sistema de resfriamento por meio de um programa que desenvolvi mostra que, quando o sistema dá os resultados esperados, o investimento pode se pagar em menos de dois anos, propiciando um lucro considerável ao produtor, após descontar todos os custos operacionais e despesas extras com alimentação necessárias para o aumento da produção de leite no verão. Por outro lado, uma fazenda leiteira que investe muito dinheiro na instalação e operação do sistema de resfriamento e que não obtém os resultados esperados pode perder dinheiro devido à queda na produção e aos altos custos de operação.
Em conclusão, é importante resfriar as vacas no verão, mas é necessário fazer isso adequadamente para a obtenção de melhorias na produção de leite e na fertilidade e, assim, obter benefícios econômicos do processo.
Fonte: Milkpoint