Estresse térmico em vacas leiteiras – como identificar e o seu impacto na produção

Patrícia Vieira Maia, Médica Veterinária

Foto divulgação Rehagro

2016_12-16

O estresse calórico é sentido tanto por nós quanto pelos animais, sendo um tema de extrema importância, pois influi diretamente na produtividade dos animais. O termo estresse pode ser aplicado a qualquer mudança ambiental suficientemente severa para introduzir respostas que afetam a fisiologia, comportamento e produção animais. O estresse calórico ocorre quando a taxa de ganho de calor de um animal excede a de perda, fazendo com que o mesmo saia de sua zona de conforto térmico. Desta forma, são necessários ajustes no comportamento e/ou fisiologia do animal.
As vacas de leite apresentam uma faixa de temperatura ambiente na qual se encontram em conforto térmico denominada zona de termoneutralidade. Nesta zona, o sistema termorregulador do animal não é acionado, seja para capturar ou dissipar calor. Assim, o gasto de energia para manutenção é mínimo, resultando em máxima eficiência produtiva, sendo considerada à faixa de temperatura ótima para a produção animal. Abaixo desta faixa de temperatura, a vaca entra em estresse pelo frio, e acima, em estresse pelo calor.
Os animais homeotérmicos, ou seja, de sangue quente, mantêm sua temperatura corporal através do equilíbrio entre o calor produzido pelo metabolismo e o fluxo de calor perdido para o ambiente. Há uma significativa diferença entre animais zebuínos, animais taurinos (europeus) e seus mestiços. Alguns autores citam que a zona de conforto térmico para zebuínos está entre 10ºC e 27ºC, taurinos entre 0ºC e 16ºC. Para os mestiços há citações menos definidas com valores entre 5ºC e 31ºC. A partir desses valores podemos perceber que animais europeus estão mais susceptíveis ao estresse calórico.
A maior susceptibilidade à temperatura é explicada no caso das raças especializadas em produção de leite, pelo grande metabolismo basal desses animais e também pela ineficiência em perder calor quando comparada a zebuínos. Esses animais apresentam maior consumo de matéria seca para manter altas produções e, consequentemente, metabolismo mais acelerado e menor eficiência em dissipar o calor produzido. Com a menor capacidade de dissipação de calor, as vacas elevam sua temperatura corpórea com maior facilidade e perdem calor para o meio ambiente com maior dificuldade. O resultado final é o maior acúmulo de calor, podendo ocorrer mais facilmente o estresse térmico.

Animal em estresse térmico
Respiração ofegante, boca aberta e língua para fora na tentativa de trocar calor com o ambiente. Em situações como esta, se os animais estão em galpões onde haja ventiladores e aspersores, estes deverão ser ligados. Caso não sejam animais de galpões o fato de molhar bem os animais em estado mais crítico pode ajudar no resfriamento.
Impactos do estresse calórico na pecuária de leite
Os impactos do estresse calórico se relacionam à redução na eficiência produtiva e reprodutiva dos animais. Além disso, geram distúrbios metabólicos e maiores chances do animal adoecer, devido à menor eficiência do sistema de defesa.
Uma das reações fisiológicas mais imediatas ao estresse calórico é a redução no consumo de alimentos, estratégia para diminuir o metabolismo basal e manter a temperatura constante. A redução no consumo de alimentos é tanto maior quanto mais intenso for o estresse. Autores citam que a 32ºC, o consumo alimentar de vacas holandesas em lactação tem queda de 20% e, a 40ºC, declina a zero. Consequentemente à diminuição na ingestão de alimentos, ocorre redução na produção e nos constituintes do leite, acarretando prejuízos aos produtores.
Alguns pesquisadores relatam que o maior volume de leite produzido por uma vaca acontece quando esta está deitada descansando. O estresse por calor, também afeta o tempo de descanso de vacas leiteiras. Nas horas mais quentes do dia, elas preferem ficar em pé ao invés de se deitarem. Dessa forma, o tempo de descanso deitado é menor quando não se proporciona espaço de sombra e ventilação suficientes para os animais.
Em relação aos danos à eficiência reprodutiva, alguns autores citam que a duração do cio de vacas leiteiras é de aproximadamente 14 horas, podendo reduzir para 8 horas em períodos mais quentes, além de reduzir o número de aceitação de montas, impactando na taxa de serviço. O estresse calórico tem efeito negativo sobre a qualidade oocitária, reduzindo as taxas de fecundação, viabilidade e desenvolvimento embrionário. Ocorre, então, queda na taxa de prenhez.

Possíveis pontos de atuação
São implementadas duas estratégias diferentes para aumentar a produção de bovinos de leite em condições de clima quente. Uma delas é o uso de raças bovinas geneticamente adaptadas, ou seja, escolher as raças de acordo com o tipo de sistema e às condições ambientais do local. A segunda estratégia é alterar o ambiente para reduzir a intensidade do estresse térmico e permitir que as vacas produzam de acordo com o potencial genético máximo.
No ambiente, podemos utilizar sombras, sendo naturais ou artificiais, que forneçam uma área de pelo menos 3 a 5 m² por animal, salientando-se que quanto maior a área destinada à sombra, menores serão os riscos de acidentes e menor a formação de barro. A sombra natural possui a vantagem de ser mais barata, mas como o crescimento das árvores é um processo lento, muitas vezes é necessário lançar mão do sombreamento artificial. Este pode ser conseguido com a utilização de sombrites, que são telas de fibra sintética e que devem fornecer de 60% a 80% de sombra.
A orientação das árvores ou da estrutura artificial deve ser planejada. Quando os animais estão confinados a melhor orientação é a leste/oeste por proporcionar sombra o dia todo. Para os animais que não estão confinados eles podem se movimentar a procura de sombra, devendo então a estrutura ter orientação norte/sul, para que a sombra “caminhe” ao longo do dia de oeste (período da manhã) para leste (período da tarde), reduzindo a formação de lama. A utilização de rodízio das áreas de sombra, quando estiverem com muita lama, também é necessária e pode ser realizada com o auxilio da cerca elétrica isolando as áreas mais criticas.
A utilização de ventiladores, aspersores e nebulizadores também pode ser planejada para galpões de confinamento, currais de espera ou em áreas cobertas e apresenta grande eficiência na retirada de calor do animal e do ambiente.
Outro fato de extrema importância é a presença de cochos de água e comida na sombra ou próximo, para que os animais não fiquem apenas na sombra e tenham seu consumo diminuído. Não é necessário ter um bebedouro grande, mas este deve apresentar um fluxo contínuo de água, uma vazão que o mantenha sempre cheio e ser mantido limpo.
Comparada a um eficaz sistema de manejo do ambiente, a manipulação da dieta da vaca leiteira em estresse calórico terá efeito relativamente pequeno sobre a produtividade. O consumo de matéria seca começa a reduzir quando a temperatura ambiente excede 25,5ºC. Uma estratégia para diminuir a queda no consumo de matéria seca é aumentar o número de fornecimento da dieta ao longo do dia. Além disso, limpar o cocho diariamente retirando sobras que possam fermentar e impactar ainda mais na queda do consumo do alimento.
Outras ações que podem ser realizadas é manter a ordenha sempre nas horas mais frescas do dia, buscando minimizar os efeitos negativos do calor quando os animais estiverem aglomerados. E evitar a lida com os animais (vacinação, pesagem, inseminação, controle de parasitos, entre outros) nos momentos mais quentes do dia, pois o calor e aglomeração dos animais irá piorar o estresse térmico.
O efeito do estresse calórico no desempenho animal, provavelmente vai se tornar muito mais importante no futuro, caso a destruição ambiental continue aumentando. Dessa forma o aquecimento global que já pode ser notado, tenderá a ter efeitos ainda maiores. Em se tratando de estresse calórico animal, deve ser promovido à integração entre técnicos, pesquisadores e produtores, na busca por alternativas viáveis e adaptadas a cada realidade. Ações que melhorem o conforto térmico do animal levam a transformação do bem-estar em maior consumo de alimentos, que resultará em aumento da produção de leite e melhora na reprodução.

Como identificar animal com estresse térmico
Algumas características são observadas quando os animais estão sofrendo com estresse calórico:

– Diminuição na produção de leite de 10 a 20%;

– Frequência respiratória acima de 80 movimentos por minuto em 70% dos animais do lote;

– Temperatura retal maior que 39,2ºC em 70% dos animais do lote ou acima de 39ºC por mais de 16 horas seguidas;

– Redução de pelo menos 10 a 15% na ingestão de alimentos e

– Aumento do consumo de água.

A primeira alteração que se pode observar em animais com estresse térmico é o aumento da frequência respiratória, com o intuito de perder calor para o ambiente. Observar os animais nos horários mais quentes do dia também é uma forma de avaliar o conforto com relação à temperatura. Os animais mudam o comportamento devido ao estresse térmico. Podemos citar como exemplo dessas mudanças a busca/disputa por sombra e vento e o aumento da frequência respiratória com a presença de baba.

Medidas que podem ser realizadas no ambiente no intuito de diminuir o estresse do animal pelo calor 

– Sombreamento adequado para os animais;

– Disponibilidade de água suficiente para os animais beberem, principalmente após a ordenha e nas horas mais quentes do dia;

– Para animais confinados em Freestall, adequado sistema de resfriamento com ventiladores e aspersores, permanecendo ligados nas horas mais quentes do dia;

– Para animais que não estão no Freestall, o fato de molhar bem os animais em estado mais crítico pode ajudar no resfriamento;

– Reduzir distâncias de deslocamento do animal e

– Na sala de espera da ordenha é um momento em que as vacas sofrem muito com o calor. Manter os animais o menor tempo possível na sala de espera, além de proporcionar aos animas uma instalação coberta, com ventiladores e aspersores, com um pé direito mais alto, pode favorecer um melhor conforto.

Fonte: equipe Rehagro