O CONTROLE DOS CARRAPATO EM VACAS DE LEITE É POSSÍVEL?

Especial VERÃO mostra o programa de controle estratégico dos carrapatos de bovinos de leite na Região Sudeste desenvolvido pela Embrapa

Tales Fernando Mattos Cesar
Médico Veterinário

É cada vez maior a exigência do consumidor em relação à qualidade dos produtos, como também as exigências da legislação em relação a isso. Aqueles que não estiverem capacitados a produzir leite com qualidade, sofrerão as penalidades do mercado (J. Furlong et al, 2007).
É inaceitável que se continue aplicando produtos não recomendados para animais em lactação, que não sejam respeitados os períodos de carência para a utilização do leite, e que sejam aplicadas formulações caseiras feitas com produtos destinados a pragas agrícolas. Para complicar um pouco mais a questão, existem no mercado produtos com o mesmo nome comercial, os quais, na dependência da forma de aplicação, se, por exemplo, “pour on” ou “injetáveis”, podem ou não ser aplicados a animais em lactação. Além disso, outra complicação que começa a fazer parte do dia a dia do produtor é a questão “Limite mínimo de resíduo permitido pela legislação” versus “Resíduo zero”, como exigido por algumas empresas compradoras de leite. Será cada vez mais forte a pressão, tanto da indústria quanto da sociedade, para a aquisição de leite com níveis de resíduos dentro dos padrões mundialmente recomendados para a segurança alimentar (J. Furlong et al, 2007).
Quando um produtor percebe que seus animais estão altamente infestados por carrapatos, imediatamente pensa nos prejuízos acarretados e resolve tomar providências. E então inicia-se uma jornada de escolher um produto e realizar uma infinidade de tratamentos, muitas vezes sem obtenção de resultados satisfatórios. Na ânsia de resolver o problema, troca-se indiscriminadamente de produto, o que só vai agravar ainda mais a situação. Em consequência disto, perde-se anualmente no Brasil cerca de dois bilhões de dólares. O problema é realmente complicado e grave, mas nem por isso a solução deve ser complexa. Basta que se tenha em mente que muito do que se perde com o carrapato decorre dos erros cometidos na tentativa de controlá-lo. Para minimizar os prejuízos, portanto, é importante conhecer bem o inimigo e identificar e corrigir os principais erros cometidos (Fonte: CNPGL EMBRAPA).

Qual a melhor época do ano para o controle?
A quase totalidade de produtores combate o carrapato somente nos períodos em que este se encontra em grande quantidade sobre os animais, determinando os prejuízos já relatados. Um programa de assistência técnica seria eficiente no intuito de orientar sobre o momento certo de se utilizar o carrapaticida como uma forma de prevenção de grandes infestações, ao invés de se combaterem surtos já estabelecidos. As pesquisas desenvolvidas pela Embrapa Gado de Leite resultaram na elaboração do programa de controle estratégico dos carrapatos de bovinos de leite na Região Sudeste. Durante quatro anos foi acompanhado o nível de infestações, tanto nos animais (fase parasitária), como na pastagem (fase de vida livre), o que possibilitou a obtenção de informações úteis para a elaboração do programa de controle. Foi verificado, inicialmente, que o carrapato dos bovinos, na Região Sudeste, desenvolve de três a quatro gerações durante o ano. A geração presente entre os meses de janeiro e abril foi considerada como a mais fraca, pois o calor excessivo mata as larvas que estão na fase de vida livre, à espera do hospedeiro, reduzindo a quantidade de carrapatos presentes nos animais e na pastagem. As altas temperaturas atuam também na aceleração da fase não-parasitária, fazendo com que os carrapatos nasçam e morram mais rapidamente, contribuindo também para a redução do nível de infestações. A partir da identificação desta fase mais vulnerável, foi possível a elaboração do programa de controle estratégico do carrapato dos bovinos leiteiros na Região Sudeste do Brasil, que também é eficaz para a Região Centro-Oeste, por apresentar condições semelhantes (Fonte: CNPGL EMBRAPA).
Esta estratégia se fundamenta na aplicação de uma série de cinco ou seis banhos carrapaticidas a intervalos de 21 dias ou três aplicações de produto “pour on” a intervalos de 30 dias, durante a época mais vulnerável do ciclo do carrapato (janeiro a abril). O objetivo é combater intensamente a geração mais fraca, de modo a comprometer as gerações seguintes, que seriam as mais prejudiciais. Durante o restante do ano basta monitorar a quantidade de carrapatos nos animais e realizar banhos quando a contagem se elevar. É recomendada atenção especial ao mês de setembro, quando a quantidade de carrapatos tenderá a se elevar, pois o aumento da temperatura leva à eclosão das larvas que estavam em formação durante o inverno. Um banho pode ser suficiente para controlar o surto repentino. Normalmente, os tratamentos extras são necessários somente durante o primeiro ano da implantação do programa, mantendo-se os níveis de carrapatos na quantidade desejada nos anos seguintes somente com as aplicações efetuadas entre janeiro e abril. Uma carga parasitária entre 20 e 30 carrapatos em um lado do corpo do animal é considerada adequada para que os bovinos desenvolvam proteção contra os agentes da tristeza parasitária. Deste modo, o carrapato, que antes era tido como um inimigo altamente prejudicial à pecuária, passa há atuar como um aliado, funcionando como um “vacinador natural” dos bovinos.
Realizando-se as ações descritas de forma correta, é possível reduzir significativamente o número de banhos carrapaticidas, de 16 a 20, para apenas cinco tratamentos anuais. Além de representar considerável economia com a aquisição de carrapaticidas, esta prática leva à redução no estresse dos animais e nos custos com mão-de-obra, minimização de resíduos no leite, elevando a qualidade e agregando valor ao produto, preservação ambiental e, principalmente, retardo no processo de resistência, garantindo maior tempo de utilização das poucas bases químicas disponíveis.
Uma pequena desvantagem deste programa de controle consiste no fato de que os banhos / pour on devem ser realizados na época das chuvas, o que poderia levar a perdas do produto e disseminação da resistência. Este problema pode ser facilmente contornado mudando-se as tarefas para outro dia, caso o dia marcado para o tratamento esteja chuvoso, ou mantendo os animais em um galpão coberto por duas horas após o tratamento. Não havendo, na propriedade, instalações suficientes para abrigar todos os animais do rebanho, a separação em lotes proporcionará a realização dos tratamentos sem transtornos.
É importante ressaltar, no entanto, que, para que o programa de controle estratégico seja bem-sucedido, tem de ser utilizado o produto certo, na dose recomendada, com diluição bem feita e aplicação adequada.

Referencias
J. Furlong; J.R. Martins; M.C.A. Prata – A Hora Veterinaria, Ano 27, no159, setembro/outubro/2007.

CNPGL EMBRAPA, http://old.cnpgc.embrapa.br/publicacoes/tese/carrapato/02revisao.html

Fonte: MilkPoint.