“Abolimos a palavra descarte, e adotamos a palavra renovação”
Rodrigo Sechi
Médico Veterinário e Especialista em Produção de Bovinos de Leite*
Uma das atividades mais corriqueiras no dia a dia de uma propriedade leiteira é – sem dúvida – o trabalho de inseminação artificial. No momento em que se está prestes a realizar este procedimento, as seguintes perguntas são feitas: O que vamos fazer hoje? Qual raça? Que touro, um mais caro, um mais barato? Mas a seguinte pergunta muitas vezes não é feita: Qual a finalidade da inseminação de hoje?
Incansavelmente, em uma propriedade leiteira, se almeja melhorar a cada dia, produzir mais com menor custo e com maior eficiência. Assim, a inseminação artificial é uma das ferramentas primordiais para esta busca, mas, muitas vezes o que acaba acontecendo é um fato que merece reflexão. Pensando que a inseminação é feita com a finalidade de melhorar o rebanho, quando filhas serão melhores que suas mães, o que acontece com as mães quando as filhas entram na vida produtiva?
Ao longo dos anos trabalhando com produtores de leite, vemos que na grande maioria, o início da atividade foi muito semelhante. No princípio, eram duas ou três vacas, uma estrebaria pequena e o sonho de um dia ter vacas boas e puras para ‘encher o tarro’. E ao longo do caminho, este sonho foi se tornando realidade, as vacas foram sendo inseminadas, começaram a ter crias cada vez melhores, a estrebaria foi aumentando. Tudo foi melhorando! Até o dia que o produtor se deu conta que estava com uma superlotação de animais.
Quando iniciamos um trabalho em um tambo leiteiro, o primeiro dado de análise é a relação de animais em produção em comparação aos animais que não estão produzindo, e, em muitas vezes, nos deparamos com um número assustador. Relato o caso de um produtor que iniciou um trabalho de melhoria em sua propriedade e – como todos os produtores – suas metas eram produzir mais e diminuir os custos para, no final, ter maior lucro. Nesta propriedade, para cada animal produzindo, quatro outros animais estavam apenas comendo e, todavia, não estavam produzindo. Ao ser questionado sobre este dado, sua resposta nos surpreendeu. Ele nos contou toda a sua trajetória desde quando começou na atividade, muito similar a que comentamos acima. Foi quando entendi que há uma dificuldade muito grande do produtor de leite em descartar animais, já que foi muito sofrido adquiri-los e é difícil de uma hora para a outra eles simplesmente serem descartados.
Então, abolimos a palavra descarte, e adotamos a palavra renovação. Assim, iniciamos o trabalho de inseminação artificial, aplicando a seguinte pergunta: Qual a finalidade da inseminação de hoje? Sugerimos ao produtor ranquear suas vacas, em uma escala de um a cinco, nos itens:
– Produção de Leite;
– Sanidade;
– Reprodução;
– Docilidade e;
– Número de lactações.
Realizamos o somatório dos valores na ordem do maior para o menor, obtivemos então, o ranking das vacas naquela propriedade. A ideia era renovar 20% do rebanho por ano, utilizando sêmen de touros melhoradores nas melhores vacas e utilizando sêmen de touros com características de carne nas demais.
No momento que conseguimos entender a dificuldade do produtor em descartar seus animais, compreendemos a facilidade da aceitação em renovar seu rebanho, fazendo entender que quantidade não é sinônimo de qualidade e que hoje possuímos uma ferramenta chamada inseminação artificial e – com ela – podemos melhorar, renovando o plantel e criando novas opções de renda no tambo.
Atualmente o produtor citado acima conta com um plantel de 22 animais, sendo 15 vacas em ordenha, duas vacas secas, cinco animais de reposição de 0 a 24 meses, que gradualmente estão sendo incorporadas no rebanho ou vendidos para reposição de outros planteis. Os demais animais nascidos na propriedade são vendidos no momento do nascimento para criadores que se dedicam à produção de carne.
*Rodrigo trabalha na Cooperativa Naranjito, no Paraguai, há 150 km de Foz do Iguaçu. Ele é responsável pelo setor de leite da cooperativa e trabalha com toda a cadeia leiteira, desde a coleta de leite, até a venda. Há cinco anos, a cooperativa vem realizando um grande trabalho junto aos seus associados para mostrar-lhes que a atividade pode sim ser lucrativa. “Temos conseguido muitos avanços, mas ainda, há muito trabalho por fazer”. A cooperativa possui 64 produtores com uma média de 208 litros/produtor/dia. “Somos pequenos mas buscamos primordialmente a qualidade, pois foi a maneira que encontramos para fazer com que estes pequenos produtores ganhem dinheiro com o leite, e assim, quem sabe, um dia eles se tornem grandes”.
Fonte: Milkpoint