O produtor deve ficar atento à organização financeira e às oportunidades
A virada do ano é marcada pela eterna música, ou melhor, pelo eterno sentimento: “Adeus, Ano Velho! Feliz Ano Novo! Que tudo se realize no ano que vai nascer! Muito dinheiro no bolso…”, de autoria de David Nasser e Francisco Alves tornou-se a canção-tema do réveillon brasileiro. E assim começa 2016 e todos perguntam: como será este ano? Política e economia são os assuntos do momento. Tanto a cidade quanto o campo estão sofrendo as turbulências do mercado. E o JORNAL HOLANDÊS reuniu importantes profissionais do mercado do leite e lançou a seguinte pergunta: Em 2016, quais são as opções para o mercado do leite? Mesmo com as expectativas para o ano que se inicia não sendo tão promissoras; a inovação, o conhecimento e o relacionamento farão a diferença nesses momentos de incerteza. E lembre-se, que em tempos de crise, você deve ficar atento, pois é nessas situações que surgem grandes oportunidades.
COM A PALAVRA o Pesquisador do mercado de leite CEPEA | Wagner Hiroshi
“Resumidamente, 2013 e a primeira metade de 2014 foram períodos marcados pelo excesso de oferta de leite, e o final de 2014 até os dias de hoje foram marcados pela demanda enfraquecida.
A queda da demanda pelos produtos lácteos se deu por conta da crise econômica que afetou diretamente o poder de compra do consumidor. Através de uma análise de elasticidade-renda da demanda chegamos à conclusão que grande parte dos derivados de leite (com exceção do leite UHT, que é um item da cesta básica, e por isso teve menor enfraquecimento no consumo) tem queda quando o poder de compra do consumidor está fragilizado. Tendência muito parecida com o que ocorre com a carne vermelha, que é substituída por carne suína ou de aves, que possuem um preço de mercado menor. Com os derivados lácteos, o consumidor acaba adquirindo queijo, manteiga e iogurte de marcas mais baratas ou simplesmente deixa de comprar.
Dessa forma, recebemos informações dos nossos colaboradores (cooperativas e laticínios) durante todo o ano de queda na demanda e esse fator impediu, até certo momento, o repasse desse aumento de preços para o produtor no período de entressafra, principalmente. Para o produtor, o ano de 2015 foi ainda mais complicado, pois os custos de produção sinalizaram aumentos durante praticamente o ano todo, e o excesso de oferta de leite em 2013 e parte de 2014 fizeram com que a indústria acumulasse estoques. Com isso, nosso indicador de preços pago ao produtor caiu por nove meses seguidos (jun/14 a fev/15), trazendo os patamares de preços desse ano, em média, 9-10% menores que o ano passado. Com os custos aumentando e a receita caindo, a margem do produtor reduziu consideravelmente e este fato fez com que alguns produtores de algumas regiões saíssem da atividade, causando maior competitividade entre os laticínios pelos produtores de leite.
Em minha opinião, as possibilidades de melhora no setor no curto prazo, ou seja, para 2016 são bem pequenas, pois os problemas com a demanda e, consequentemente, com o poder de compra só irão melhorar quando a economia do país voltar a crescer. Pensando pelo lado do pecuarista de leite, que não possui controle da sua receita, pois a formação de preços é feita com a indústria, a melhora na rentabilidade só será possível se ele conseguir maximizar a produção e a produtividade da atividade com os menores custos de produção possíveis. Outro fator que corrobora com esse momento difícil para o produtor é o período de safra nacional que estamos passando agora e que geralmente se estende até o final do primeiro trimestre, onde a oferta de leite aumenta mês a mês e os preços do leite pago ao produtor tende sofrer quedas. No final e inicio do ano a demanda se enfraquece ainda mais devido ao período de férias escolares, com isso o consumo por leite em pó cai consideravelmente e é mais um fator que pressiona as cotações nesse período sazonal de quedas de preços”.
COM A PALAVRA O Engenheiro Agrônomo, CEO da AgriPoint | Marcelo Pereira de Carvalho
Em certos aspectos, 2016 será semelhante a 2015: a economia não deve se recuperar, o que afeta o consumo. Além disso, os custos de produção devem ter alta expressiva (na nossa projeção, uma ração de 67% milho, 30% soja e 3% mineral) deve ter alta de 15,5% sobre 2015.
No entanto, diferentemente de 2015, vemos alguns fatores positivos que podem melhorar a remuneração do produtor: o ano se inicia com uma oferta de leite baixa, reflexo das menores margens recebidas pelo produtor ao longo de 2015 e, também, dos diversos problemas climáticos devido ao excesso de chuvas no Sul e à falta de chuvas em Minas Gerais e Goiás. Essa restrição na oferta pode gerar uma maior competição pelo leite no campo mesmo em um cenário de economia deprimida, elevando os preços pagos ao produtor.
Outro ponto importante é que a alta do dólar, apesar de trazer pressões de custo ao produtor, desestimula a entrada de produtos importados: em 2015, as importações tiveram impacto expressivo em nosso mercado, principalmente no primeiro semestre. Dependendo do patamar que o dólar alcançar, podemos até mesmo ter oportunidades de exportação.
Devido a essa conjuntura de fatores, é possível que tenhamos uma elevação de preços significativa ao longo do primeiro semestre. Vale lembrar que, neste final de ano, ao contrário do que costuma ocorrer, a queda de preços foi, no geral, pequena, sugerindo mercado equilibrado em um momento de aproximação do fim da estação das águas.
Com os custos de alimentação elevados, o produtor que conseguir produzir proteína e energia através de volumosos de alta qualidade, principalmente em pastejo, tende a ter resultados expressivamente melhores que em 2015.
COM A PALAVRA o Presidente da ASBIA | Carlos Vivacqua Carneiro Luz
“O setor de inseminação artificial, através da Associação Brasileira de Inseminação Artificial – ASBIA, que representa 95% do mercado de IA, tem identificado constante e crescente profissionalização nos programas de melhoramento genético, nos rebanho brasileiros, através da utilização de touros provados e de alto valor genético.
Há alguns poucos anos, identificava-se como a maior demanda por parte dos produtores nacionais, touros com altos volumes de leite e bons compostos de úbere, pernas e patas. Este critério de seleção vem sofrendo grande alteração e atualmente nota-se a predominância por sêmen de animais com estrutura mediana, características de saúde positiva (Vida Produtiva, Cel. Somática e Prenhes das Filhas), alinhado com produções medianas de leite (não extremadas) e animais mais equilibrados e positivos para sólidos.
A utilização do índice TPI, como base de seleção também vem sendo validada por muitos, pois este índice sofreu significativos ajustes nos últimos anos, trazendo para sua formulação características e valores mundiais, deixando de representar exclusivamente valores dos produtores americanos. Assim, cresceu a aceitação global na utilização do TPI como índice de seleção. Esta é uma tendência mundial e que chegou ao entendimento dos produtores brasileiros, como sendo válida para nossos sistemas de produção e remuneração da atividade.
O advento da genômica trouxe maior dinamismo ao setor e a oferta de novos indivíduos torna-se uma constante. As centrais que operam em nosso país oferecem aos produtores da raça Holandesa o que há de mais atual e a melhor genética disponível no mercado global. Todos, sem nenhuma ausência, grandes touros disponíveis no mundo estão também disponíveis à nossos produtores. E, isto permite que nossos programas de melhoramento genético alcancem os índices que visualizamos atualmente.
A Inseminação Artificial é um insumo que tem o custo de somente 2% do custo de produção e é o único insumo que deixa residual entre gerações. Ou seja, não há no sistema de produção nenhum insumo com esta relação custo x benefício”.
CNA REALIZA BALANÇO 2015 E PERSPECTIVAS 2016
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA divulgou no mês passado o balanço de 2015 e as perspectivas para 2016 do setor agropecuário e segundo relatório tudo indica que não haverá grandes incrementos na produção de leite em 2016, visto que a situação econômica do país tende a manter os indicadores negativos que afe¬tarão diretamente a demanda. Segundo o Boletim Focus do Banco Central – BC, de 23 de outubro de 2015, o Produto Interno Bruto – PIB passará de – 3,0% em 2015 para – 1,4%, em 2016, mantendo o país em recessão econômica. A inflação medida pelo Ín¬dice de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA em 2016, está estimada em 6,22%, ainda acima do centro da meta, (4,5%), mas dentro da margem de segurança de dois pontos percentuais, estabelecida pelo governo.
Em relação à oferta de emprego, de acordo com as projeções da LCA Consulto¬ria, com base nos dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), em 2016, pouco mais de 800 mil postos de emprego serão fechados, praticamente metade do previsto para 2015, o que sinaliza a manutenção do “fan¬tasma do desemprego”.
Essa conjuntura resulta em menor poder de compra da população, o que para o setor lácteo implica em redução do consumo de produtos de alto valor agregado, como queijos e iogurtes. As projeções do Rabobank corroboram este fato, indi¬cando que haverá queda no consumo de produtos lácteos no Brasil no decorrer de 2016. Com a demanda interna reprimida, uma alternativa seria contar com as exportações, mesmo que pequenas, poderiam sinalizar melhorias nos preços pa¬gos aos produtores.
Para 2016, o Boletim Focus estima que a cotação média do dólar no período será de R$ 4,05, valor 19% maior do que a média prevista para 2015. Esse cenário é positivo para o setor lácteo no que se refere à balança co¬mercial, pois dificulta as importações em função do aumento da competitividade da indústria nacional e favorece as exportações devido à desvalorização do real. Entretanto, para que haja maior exploração das oportunidades oferecidas pelo mercado internacional, além do câmbio será necessário melhoria nos preços das commodities lácteas.
Se, por um lado, a desvalorização do câmbio ajuda na melhoria do saldo da balança comercial de lácteos, por outro, onera ainda mais os custos de produção do leite. Insumos utilizados em larga escala na pecuária leiteira, como fertilizantes, defensivos, sal mineral e medicamentos são basicamente importados, o indicando que terão seus valores corrigidos em função do aumento do dólar. Na mesma linha de valorização, seguem o milho e o farelo de soja, principais ingredientes da ração concentrada. Apesar dos estoques elevados, os preços da soja e do milho na Chicago Board of Trade – CBOT estão próximos aos preços mínimos dos Estados Unidos.
No entanto, para o Brasil a baixa nos preços internacionais é compensada pelo câmbio, tanto que a comercialização futura destes produtos estão bem adiantadas em relação a anos anteriores. Nesse contexto, o cenário que se desenha para os custos de produção é bastante preocupante, pois além dos itens citados, ainda há o incremento no salário mínimo, permitindo inferir que a única certeza para 2016 será que o custo de produção do leite será bem maior que o praticado em 2015.
Segundo o presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA, João Martins “não faltará alimentos e nem haverá desabastecimento dos gêneros de primeira necessidade. A CNA está atenta aos problemas conjunturais da economia brasileira e seus possíveis reflexos no desempenho do setor agrícola e decidiu reativar a Comissão Nacional de Política Agrícola que ficará encarregada de analisar e buscar alternativas capazes de “blindar o setor dos impactos negativos”.
O presidente da comissão, o vice-presidente diretor da CNA, José Mário Schreiner, defendeu que uma das medidas emergenciais para atender o setor seria elevar a R$ 1,2 bilhão os recursos públicos destinados ao prêmio de subvenção ao seguro rural da próxima safra. A verba prevista até agora para as operações do seguro rural é de R$ 400 milhões.
Para Schreiner, o objetivo principal da Comissão de Política Agrícola é buscar alternativas para “blindar o setor da crise. Como diz o ditado popular quando você tem, no cesto, uma laranja podre, esta pode contaminar as demais. Mas, no nosso caso, precisamos saber como proteger a única laranja sã – a agricultura e a pecuária -, dos demais segmentos contaminados”, disse.
Já o superintendente técnico da CNA, Bruno Lucchi, avaliou que mesmo diante das dificuldades da economia, a produção de grãos em 2016 deve crescer acima de 2%, com destaque para a soja, cuja área plantada terá incremento de 3,8% e a produção outros 6,8%. Lucchi considerou satisfatório o desempenho do PIB do agrícola em 2015: previsão de pequena queda (-0,7%), aceitável levando-se em conta a retração geral da economia brasileira prevista para este ano (-3,5%).
O economista da LCA Consultoria, Fernando Sampaio, entende que o ano de 2015 “foi uma surpresa altamente negativa, com o PIB devendo apresentar queda expressiva de 3,5%, devido às incertezas políticas que acabaram provocando forte desconfiança do setor empresarial, levando ao adiamento ou a suspensão de investimentos”.
A Superintendente de Relações Internacionais – SRI da CNA, Alinne Betania Oliveira, apresentou um resumo dos resultados do agronegócio brasileiro no mercado externo, destacando que as vendas do segmento alcançarão US$ 89 bilhões, representando 48% de todo o comércio externo do país.
Segundo ela, os produtos brasileiros continuam competitivos no mercado internacional, mas algumas questões precisam ser observadas com prioridade, casos dos acordos comerciais. O Brasil terá de apressar acordos de comércio com a União Europeia, Rússia e China, especialmente “para não perder terreno na dura competição do comércio internacional”.
Assim, resta ao produtor maior acompanhamento administrativo do seu negócio, visto que 2016 será um ano de margens apertadas. Ademais, o cuidado com a qualidade do leite deverá ser redobrado, visto que em julho de 2016 passa valer os parâmetros internacionais de qualidade do leite para as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, conforme a Instrução Normativa nº 62/2011 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA, o que deverá mobilizar toda cadeia para adequação da norma.