ATENÇÃO À RESPIRAÇÃO DOS ANIMAIS

Doenças respiratórias afetam rebanhos do mundo inteiro e possuem um impacto negativo principalmente na fase de cria de bezerros

O maior rebanho bovino do mundo em 2020 foi o brasileiro, representando 14,3% do rebanho mundial, com 217 milhões de cabeças, seguido pela Índia com 190 milhões de cabeças, e, o rebanho brasileiro também foi considerado o maior exportador mundial (GUARALDO, 2021), sendo assim, a pecuária tem um papel fundamental para a economia nacional.

É importante manter a sanidade do rebanho para que os animais inseridos nessa cadeia produtiva se mantenham saudáveis a fim de evitar prejuízos para o produtor com tratamentos, queda na produção e descarte dos animais.

As doenças respiratórias afetam bovinos no mundo inteiro, independente do modelo de produção (confinado ou a pasto), e possuem um impacto negativo principalmente na fase de cria de bezerros, acarretando em prejuízos extensos, direta e indiretamente quando levam um animal a óbito ou retardam seu desenvolvimento. Portanto, o manejo preventivo é a forma mais eficiente de diminuir a incidência e a gravidade de problemas respiratórios em um rebanho.

A origem dos problemas respiratórios está associada a um desequilíbrio na tríade dos três princípios básicos da infecção:

Microrganismo;

Animal;

Ambiente.

Havendo a presença de um ou mais microrganismos patogênicos, associados a uma deficiência da imunidade do animal e a fatores ambientais predisponentes, a contaminação irá evoluir para uma infecção.

Por conta disso é necessário que o produtor tenha atenção principalmente a cura do umbigo imediata após o nascimento com iodo a 10%; a oferta de colostro em quantidade ideal (10% a 12% do peso corporal), de boa qualidade (acima ou igual a 25% no refratômetro brix) e no tempo certo (5% em até duas horas após o nascimento); bem como manejo do umbigo, observação de parâmetros do bezerro ao nascimento (atenção, vitalidade, peso, temperatura e etc.), higiene no bezerreiro com limpeza periódica e por fim, o alojamento dos animais deve ser bem ventilado de temperatura amena e que ofereça proteção contra intempéries.

Alguns fatores de risco aumentam a incidência de doenças respiratórias na fase de cria, sendo o principal a falta de ventilação nos alojamentos pela alta taxa de lotação, além do excesso de umidade, poeira em grande quantidade ou agentes infecciosos presentes nas acomodações, alterações bruscas de temperatura que causam estresse térmico nos bezerros, e demais fatores que debilitam o sistema respiratório ou agravam quadros de doenças respiratórias.

A pneumonia possui etiologia multifatorial podendo ter diferentes tipos de origem. É comum ser desencadeada por agentes físicos e químicos que vão predispor o bezerro aos agentes infecciosos oportunistas presentes no ambiente ou próprios de suas vias aéreas.

É preciso levar em consideração além do agente causador da pneumonia, o sistema imunológico do bezerro, o tipo de manejo ao qual o animal está sendo submetido e suas condições corporais, que vão influenciar na gravidade da doença em cada animal (ROCHA, 2011).

Em termos clínicos, as pneumonias geralmente são classificadas em três categorias:

Broncopneumonias,

Pneumonias intersticiais;

Pneumonias metastáticas.

Os sinais clínicos e tratamento vão variar em cada caso, de acordo com a causa da pneumonia, mas os sinais mais comuns são quadros de taquipneia (respiração acelerada) e dificuldade respiratória. O tratamento também vai depender do quadro clínico, sendo necessário a adoção de tratamento de suporte, afim de reduzir os sintomas e fornecer conforto ao animal.

Nesse sentido, quanto mais cedo for feito o diagnóstico melhor será o prognóstico para o animal, além de evitar a disseminação da doença pela propriedade quando se tratar de causas infecciosas e resultar em menor prejuízo para o produtor (ROCHA, 2011; SILVA; FECKINGHAUS, 2019).

 CLASSIFICAÇÃO DAS PNEUMONIAS

 SÍNDROME DA ANGÚSTIA RESPIRATÓRIA (SAR)

A SAR é uma doença causada por uma insuficiência respiratória progressiva que ocorre devido à ausência de surfactante pulmonar em neonatos, sendo um problema mais comum em animais prematuros (BALEST, 2018).

Animais advindos de técnicas como fertilização in vitro e clonagem são acometidos pela SAR com maior frequência, assim como neonatos prematuros. A relação da SAR com a prematuridade dos animais é devido a maturação do pulmão coincidir com a maturidade fetal, apresentando uma relação direta com a produção do surfactante (DANTAS, 2015), ou seja, o surfactante não é produzido em quantidade adequada até o final da gestação.

O surfactante pulmonar é um líquido que reduz de forma significativa a tensão superficial dentro do alvéolo pulmonar, diminuindo a tendência dos alvéolos se colabarem e auxiliando no trabalho de insufla-los. O surfactante previne o colapso durante a expiração sendo essencial para que o animal respire de forma adequada, quando ausente é necessária uma maior pressão do ar para encher os alvéolos.

No colapso pulmonar há extravasamento de proteínas do sangue para dentro dos alvéolos, inibindo ainda mais a produção de surfactante, lesionando do tecido alveolar e consequentemente impedindo as trocas gasosas (DANTAS, 2015).

BRONCOPNEUMONIA INFECCIOSA

Agentes infecciosos são a causa principal da broncopneumonia que se caracteriza por alteração inflamatória de brônquios, bronquíolos e parênquima pulmonar, sendo o problema respiratório mais frequente em bezerros.

Em geral, os animais acometidos por esse padrão de pneumonia tem o início do quadro com infecções virais (Herpesvirus bovino-1, vírus da parainfluenza-3, vírus sincicial respiratório bovino) que promovem lesões nos tecidos do sistema respiratório, aumentado a suscetibilidade à agentes, principalmente as bactérias, que residem no trato respiratório.

Vírus também são responsáveis por modificação dos sistemas imune inato e adaptativo por meio da alteração de macrófagos alveolares, supressão da proliferação de linfócitos e morte celular, além da liberação de citocinas modificadas (PANCIERA et al., 2010).

Após as lesões no epitélio e comprometimento das defesas imunológicas das vias respiratórias causadas pelos vírus, as bactérias que são comensais do trato respiratório podem proliferar e ocasionar a pneumonia.

Segundo Panciera et. al., (2010) os principais agentes da infecção bacteriana que ocorre secundariamente são Mannheimia haemolytica, Pasteurella multocida, Histophilus somni (anteriormente Haemophilus somnus ), Arcanobacterium pyogenes , Mycoplasma bovis e, mais recentemente, Bibersteinia trehalosi (anteriormente Pasteurella trehalosi).

Esses agentes bacterianos causam infecções com padrões de lesão graves, sendo a boncopneumonia supurativa, pneumonia fibrinosa ou pleuropneumonia fibrinosa e a broncopneumonia necrótica os mais comuns.

PNEUMONIA INTERSTICIAL

Se caracteriza pela inflamação do parênquima pulmonar de natureza não infecciosa. Esse termo é mais utilizado para designar uma lesão e não uma doença, já que esse tipo de pneumonia se refere a uma intensa inflamação pulmonar difusa, geralmente decorrente da inalação de toxinas ou infecções virais isoladas, além de exposição à compostos químicos, vírus, larvas de alguns parasitas migratórios, gases tóxicos e algumas condições ambientais que desorganizam a resposta imunológica no sistema respiratório com consequente lesão dos alvéolos.

Após exposição ao agente, o processo se inicia com morte de pneumócitos e das células epiteliais bronquiolares, além de acúmulo de células inflamatórias, predominantemente macrófagos, e proliferação de fibroblastos no espaço intersticial.

Ocorre dano das paredes dos capilares alveolares (pequenos vasos sanguíneos) por substâncias liberadas pelos leucócitos; a lesão endotelial causa um aumento na permeabilidade vascular, levando a um edema intersticial e, posteriormente, alveolar.

Em meio ao líquido que extravasa dos vasos para o interior dos alvéolos, escapam também outras proteínas, incluindo fibrina, que se deposita na parede alveolar, formando redes de fibrina que inutilizam o alvéolo.

Com o tempo a lesão evolui conferindo uma aparência glandular aos alvéolos pulmonares. Em geral, ela pode ocorrer em vários padrões de envolvimento pulmonar e a mais bem caracterizada é a pneumonia intersticial difusa (PANCIERA et al., 2010)

PNEUMONIA VERMINÓTICA

A pneumonia verminótica tem como principal agente etiológico em bovinos o Dictyocaulus viviparus, as lesões podem ser encontradas em gado confinado ou a pasto.

Os bovinos se infectam através da ingestão de larvas em ambientes úmidos e os sinais clínicos variam de acordo com a fase de infecção (pré-patente, patente, pós- patente e reinfecção)

As lesões acontecem à medida que as larvas migram para o pulmão, formando pequenos focos de pneumonia intersticial e bronquiolite eosinofílica, também é visto atelectasia e enfisema. Na macroscopia o padrão é marcado por lesões bilaterais nos lobos caudais (PANCIERA et. al., 2010).

PNEUMONIA TUBERCULOSA

A tuberculose é doença infecciosa de notificação obrigatória e de controle nacional. Seu agente etiológico é o Mycobacterium bovis que causa granulomas caseosos nos pulmões e ocasionalmente em outros órgãos. Além disso os linfonodos regionais, em especial o retrofaríngeo e brônquicos são alvos específicos da infecção do agente bacteriano.

A tuberculose é uma zoonose, facilmente transmissível dos animais para os humanos, entre animais do rebanho e de animais silvestres para o bovino.

Não há tratamento nem vacina para a doença em bovinos, portanto a prevenção é a chave do controle.

Uma vez que é detectado um animal com tuberculose, a solução é o abate sanitário ou sacrifício. Para erradicar, ou controlar a doença na propriedade deve-se testar todos os animais, além de ter o cuidado de adquirir apenas animais negativos ao teste intradérmico para tuberculose.

No Brasil há o Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e da Tuberculose Animal – PNCEBT que deve ser seguido pelos pecuarista garantindo a sanidade do rebanho.

OUTROS TIPOS DE PNEUMONIA

As pneumonias aspirativas são causadas pela inalação de grandes quantidades de material estranho, muitas vezes de líquidos. Pode ocorrer em bezerros alimentados artificialmente ou na administração de medicamentos orais, em que o líquido é aspirado, problema conhecido como “falsa via”, comum acontecer quando o líquido é forçado ou quando o bezerro está com atenção deprimida devido a algum outro problema.

Em partos prolongados, difíceis, a aspiração de mecônio secundária à angustia fetal é um fator de risco de mortalidade neonatal de bezerros. O prognóstico é reservado em todos os casos de pneumonia aspirativa.

As pneumonias metastáticas são caracterizadas por embolização séptica dos pulmões, a partir de outros focos no organismo, e o problema é pouco frequente em bovinos com menos de um ano de idade.


CONCLUSÕES

A fase de cria é o período de desenvolvimento crítico e repleto de desafios tanto para o bezerro quanto para o produtor rural e, em muitas propriedades, as doenças do trato respiratório são o principal entrave para o êxito na criação dos bezerros (ROCHA, 2011).

Na bovinocultura a maior incidência de óbito acontece nos primeiros dias de vida dos bezerros, diminuindo ao longo dos dias, conforme o animal se desenvolve. Por isso, é de extrema importância os cuidados primários com neonatos:

– Oferta de colostro em quantidade ideal e de boa qualidade em até duas horas,

– Cura do umbigo imediata após o nascimento,

– Redução de estresse através de práticas de manejo que visem o bem-estar dos animais, evitando que os fiquem expostos a condições climáticas adversas, dentre outros fatores.

Outras medidas como vacinação da vaca gestante e dos animais após o nascimento também se mostram efetivas para alguns agentes, mas é essencial que todo o manejo higiênico e sanitário do local seja adequado, reduzindo assim a incidência das doenças respiratórias em bezerros e concluindo com êxito a criação.

Fonte: Milkpoint escrito por Ana Paula Lopes Marques e Clayton Bernardinelli Gitti, orientadores na UFRRJ e Anna Carla Silva Cunha e Keity Kelly Vianna Benetti, discentes